As novas tecnologias proporcionam uma informação que a minha memória já não estaria em condições de dar: foi um 15 de novembro de 2003.
Nesse dia Caralhadas acudiu ao Luxemburgo para participar da última fase de um processo de seleção de pessoal do European Investment Bank, EIB, instituição financeira da União Europeia criada em 1958 com o objetivo de apoiar os objectivos prioritários de integração e desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas da união.
Éramos apenas 5 os candidatos selecionados para a última rodada, e como acontece nos filmes que desvelan o final desde o primeiro minuto não houve sorte. De ter conseguido o trabalho, provavelmente a minha vida teria mudado radicalmente, como funcionário da União Europeia.
Para fazer o currículo em inglês que enviei para participar do processo de seleção traducín o que tinha em espanhol de quando conseguin o trabalho que tinha na altura em Madrid. No original dizia que as minhas línguas maternas são galego e espanhol. "Como no EIB não vão ter idéia do que é o galego -pensei- pois não vou tirar uma língua do currículo: ponho que o português é minha língua materna, e arreando . Total, o trabalho a oferta é de gestor de fundos de rendimento fixo e monetários, o que caralho lhes importará no Luxemburgo se o que falo é português ou galego? "
A entrevista inicial foi um 'bombardeio' de perguntas que me iam fazendo simultaneamente entre 3 ou 4 pessoas de EIB sobre assuntos acadêmicos, profissionais, etc. Qual seria a minha surpresa quando uma parte da entrevista centrou-se no meu português como língua materna:
- Uma das razões pelas quais você foi selecionado para a última rodada é a sua competência em línguas. O inglês é claro vai ser imprescindível no trabalho, mas no dia-a-dia não o vais usar muito. No Luxemburgo as línguas oficiais são francês, alemão e luxemburguês, pelo menos vais precisar o francês. Que nível você tem?.
- Bom ... estudiei dois anos no instituto... falar não falo muito ...
- Vais ter de estudar francês, porque vaiche fazer falta no dia-a-dia. Mas tem sorte, porque outra das línguas no seu CV é muito útil no Luxemburgo: também fala português língua materna, não? No Luxemburgo não é um idioma oficial, mas houve muito imigração há anos de pessoas de países de fala portuguesa, i é um idioma muito falado. Algum dos seus pais é português?
E aqui pensei "tragam terra, como lhe faço entender". Por um instante véuseme à cabeça as típicas conversas em Galiza com españolistos: "el gallego y el portugués no son lo mismo, eso lo decís los nacionalistas porque el gallego no vale para nada". Assim que traguei saliva, e comencei a explicar aos entrevistador que a Galiza é uma parte do Estado espanhol que, na Idade Média, falava a mesma língua que Portugal, e que por razões históricas, desde o século XVI ficou definitivamente integrado na Espanha, e as línguas tomaram caminhos diferentes.
- Na escrita-lhes disse-são muito parecidas, quase idênticas, na fala o português muda bastante.
- Mas eles entendem?
- Sim, sim, sem problema.
- Perfeito, então vai ser muito útil aqui.
I então, para minha surpresa, explicáronme que entendiam a situação perfeitamente porque no Luxemburgo passa uma coisa muito semelhante entre o luxemburguês eo alemão.
Éramos apenas 5 os candidatos selecionados para a última rodada, e como acontece nos filmes que desvelan o final desde o primeiro minuto não houve sorte. De ter conseguido o trabalho, provavelmente a minha vida teria mudado radicalmente, como funcionário da União Europeia.
Para fazer o currículo em inglês que enviei para participar do processo de seleção traducín o que tinha em espanhol de quando conseguin o trabalho que tinha na altura em Madrid. No original dizia que as minhas línguas maternas são galego e espanhol. "Como no EIB não vão ter idéia do que é o galego -pensei- pois não vou tirar uma língua do currículo: ponho que o português é minha língua materna, e arreando . Total, o trabalho a oferta é de gestor de fundos de rendimento fixo e monetários, o que caralho lhes importará no Luxemburgo se o que falo é português ou galego? "
A entrevista inicial foi um 'bombardeio' de perguntas que me iam fazendo simultaneamente entre 3 ou 4 pessoas de EIB sobre assuntos acadêmicos, profissionais, etc. Qual seria a minha surpresa quando uma parte da entrevista centrou-se no meu português como língua materna:
- Uma das razões pelas quais você foi selecionado para a última rodada é a sua competência em línguas. O inglês é claro vai ser imprescindível no trabalho, mas no dia-a-dia não o vais usar muito. No Luxemburgo as línguas oficiais são francês, alemão e luxemburguês, pelo menos vais precisar o francês. Que nível você tem?.
- Bom ... estudiei dois anos no instituto... falar não falo muito ...
- Vais ter de estudar francês, porque vaiche fazer falta no dia-a-dia. Mas tem sorte, porque outra das línguas no seu CV é muito útil no Luxemburgo: também fala português língua materna, não? No Luxemburgo não é um idioma oficial, mas houve muito imigração há anos de pessoas de países de fala portuguesa, i é um idioma muito falado. Algum dos seus pais é português?
E aqui pensei "tragam terra, como lhe faço entender". Por um instante véuseme à cabeça as típicas conversas em Galiza com españolistos: "el gallego y el portugués no son lo mismo, eso lo decís los nacionalistas porque el gallego no vale para nada". Assim que traguei saliva, e comencei a explicar aos entrevistador que a Galiza é uma parte do Estado espanhol que, na Idade Média, falava a mesma língua que Portugal, e que por razões históricas, desde o século XVI ficou definitivamente integrado na Espanha, e as línguas tomaram caminhos diferentes.
- Na escrita-lhes disse-são muito parecidas, quase idênticas, na fala o português muda bastante.
- Mas eles entendem?
- Sim, sim, sem problema.
- Perfeito, então vai ser muito útil aqui.
I então, para minha surpresa, explicáronme que entendiam a situação perfeitamente porque no Luxemburgo passa uma coisa muito semelhante entre o luxemburguês eo alemão.
I então, o galeguinho o que lhe disseram que "cuando salgas de la aldea verás que el gallego no te sirve para nada", não só descobriu que não era verdade, mas duas coisas mais:
- Que onde a gente não está contaminada pelo discurso nacionalista espanhol aceita-se perfeitamente que duas línguas que não são idênticas mas sim muito próximas podem considerar-se uma mesma língua, quando para efeitos práticos são permitidos a dois falantes se comunicar entre si, cada qual em seu registro. Por isso, para quem não quer ver o galego como a mesma língua que o português, o que não pode negar é que saber galego é tão válido internacionalmente como saber português.
- Que onde a gente não está contaminada pelo discurso nacionalista espanhol aceita-se perfeitamente que duas línguas que não são idênticas mas sim muito próximas podem considerar-se uma mesma língua, quando para efeitos práticos são permitidos a dois falantes se comunicar entre si, cada qual em seu registro. Por isso, para quem não quer ver o galego como a mesma língua que o português, o que não pode negar é que saber galego é tão válido internacionalmente como saber português.
- Que a Galiza não é um caso único no mundo. Toda a Europa está plagada de casos semelhantes, línguas que tiveram de compartilhar espaços, guerras que foram mudando fronteiras não só política mas também linguísticas. E hoje, em outros países europeus, como Luxemburgo respétase essa variedade lingüística e foméntase que as línguas históricas não só não se percam, senão que sejam hegemônicas nas sociedades que as criaram.
Por isso, quando eu vi no Ecolíngua 2009 'O caso do Luxemburgo', entendín muitas das coisas que me aconteceram naquela entrevista do EIB em 2003:
Ecolingua 2009: O caso do Luxemburgo em Igea on Vimeo.
Quem tem tempo de ouvir esta palestra de Edelmiro Momam sobre a realidade lingüística do Luxemburgo, conhecer a situação que já vos adiantei em parte da convivência de 3 línguas oficiais (francês, luxemburguês e alemão) e 2 muito usadas em diversos ambientes (inglês na banca internacional, português na imigração). Mas, talvez mais importante ainda, a partir do minuto 22:50 fala de como se aborda no ensino desta situação de 5 línguas utilizadas socialmente.
Pensem como algums vil.lingües estão jogando contra o ensino em galego em uma sociedade de 2 línguas, e agora observem como resolvem no Luxemburgo um ensino em 4 línguas:
Pensem como algums vil.lingües estão jogando contra o ensino em galego em uma sociedade de 2 línguas, e agora observem como resolvem no Luxemburgo um ensino em 4 línguas:
- Um aluno ao final do bacherelato para obter o título tem de demonstrar competência plena em 4 línguas: luxemburguês, francês, a norma internacional do luxemburguês (isto é, em alemão) eo inglês. Seria o mesmo que exigir a todos os jovens galegos que para terminar o ensino obrigatório têm de ser competentes em galego, espanhol, a norma internacional do galego (ou seja, o português) eo inglês.
- Como se consegue isso? As crianças da primária iniciam os seus estudos com vários anos de imersão lingüística na língua própria do país, o luxemburguês (o galego), porque é "a linguagem do coração". O ensino do alemão (português) eo francês (espanhol) já estão presentes no ensino desde muito cedo, mas dentro de uma imersão linguística em luxemburguês (galego). Depois continua com imersão lingüística em alemão (português) desde o final da primária aos primeiros cursos de ensino médio. Progressivamente se vão introduzindo o francês (espanhol) e inglês, até que nos próximos anos do ensino médio se procede a vários cursos de imersão linguística em francês (espanhol).
Desta forma, os alunos terminam os seus estudos perfeitamente competentes em pelo menos 4 línguas, e a sociedade luxemburguesa é perfeitamente cuatrilíngüe. E a isso é preciso somar a população que tem o português ou outras línguas como própria.
Funciona esse modelo?
No próximo capítulo contarei por qué eu sei que sim.
- Como se consegue isso? As crianças da primária iniciam os seus estudos com vários anos de imersão lingüística na língua própria do país, o luxemburguês (o galego), porque é "a linguagem do coração". O ensino do alemão (português) eo francês (espanhol) já estão presentes no ensino desde muito cedo, mas dentro de uma imersão linguística em luxemburguês (galego). Depois continua com imersão lingüística em alemão (português) desde o final da primária aos primeiros cursos de ensino médio. Progressivamente se vão introduzindo o francês (espanhol) e inglês, até que nos próximos anos do ensino médio se procede a vários cursos de imersão linguística em francês (espanhol).
Desta forma, os alunos terminam os seus estudos perfeitamente competentes em pelo menos 4 línguas, e a sociedade luxemburguesa é perfeitamente cuatrilíngüe. E a isso é preciso somar a população que tem o português ou outras línguas como própria.
Funciona esse modelo?
No próximo capítulo contarei por qué eu sei que sim.
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